quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Tentando Entender a Crise Global – Parte 1: A Elite Inteligente

Uma das coisas mais corriqueiras desse nosso mundo é a busca de conceitos ideológicos e éticos que venham a justificar a situação de vida dos indivíduos.
É comum ouvir de pessoas com posição econômica tranqüila que a pobreza é fruto da vagabundagem; os mal sucedidos, por sua vez, comumente relacionam a riqueza com o roubo; os fracassados justificam sua condição pessoal à falta de apoio; até os bandidos têm jargões para justificar suas atividades contra as vítimas.
Se por um lado tais interpretações da realidade são filosoficamente rasas, o fato é que esses e outros pensamentos simplórios são a matéria-prima fundamental para movimentos políticos e culturais de grandes dimensões.
E vários dos principais conflitos sociais e geopolíticos da humanidade se pautaram por diferenças de interesses econômicos, mesmo que eventualmente mascarados por diferenças de cunho religioso, racial ou de castas.
Normalmente, os resultados desses confrontos – quando dentro de uma mesma nação - acabaram em sínteses interessantes: a oposição entre  patrícios e plebeus foi fundamental para construir a grandiosa república romana; o modelo do parlamento britânico também foi fruto de um conflito de classes que acabou em acordo. A revolução francesa – mesmo sendo barra pesada - resultou no longo prazo em um país desenvolvido. A velha provocação de Maria Antonieta ao povo, dizendo: “se não tem pão, que comam brioches” gerou grande pancadaria e festival de cabeças decepadas no país.
Mas também existiram casos em que foi impossível se restabelecer o equilíbrio, o que acabou significando a extinção da elite até então dominante, especialmente aquela mais empreendedora.
No final das contas, os países que viveram essa experiência acabaram em ruínas, mesmo que tenham tido um período de apogeu. O caso clássico é a ex-União Soviética. Mas a situação mais radical foi no Camboja, onde a população urbana foi dizimada pela rural. A China teve sorte: os endinheirados do país conseguiram escapar de Mao Tse Tung fugindo para Taiwan, Hong Kong ou Macau e inteligentemente alimentaram o empreendedorismo do país, quando isso se tornou possível. Por fim, a subida de Hugo Chaves ao poder é explicada pela miopia da elite venezuelana que não soube tratar de forma razoável a pressão social no próprio país.
Dentro desse contexto histórico é comum muitos analistas destacarem a burrice das elites, na medida em que elas não buscam evitar levantes que ameaçam a existência delas próprias.
Mas aparentemente os bilionários franceses aprenderam as lições do passado. Nos últimos dias, as pessoas mais ricas da França estão iniciando um movimento voluntário de aumentar a própria carga tributária. Será bondade? Nada disso! Trata-se de sobrevivência mesmo!
A crise financeira mundial afetou a Europa com uma intensidade até superior do que aos Estados Unidos. Os governos da União Européia jogaram pesado na estabilização do Euro entre 2008 e 2009, cobrindo os furos de bancos e seguradoras com a emissão emergencial de moeda (especialmente títulos de dívida).
E agora, com a volta das instabilidades, os próprios governos acabaram ficando bastante vulneráveis, o que coloca absolutamente tudo sob um elevado e inconveniente risco de insolvência.
Sendo assim, o altruísmo dos bilionários franceses está focado no reforço do Estado para que ele não quebre, o que provocaria a bancarrota de todo o país, inclusive dos próprios bilionários.
Definitivamente, a elite francesa aprendeu a se portar inteligentemente...
Na próxima postagem: O que aconteceu com a riqueza do mundo na crise?

Até breve

Eduardo S. Starosta

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Algumas Curtas para Cutucar

1)  Foi o Ministério do Trabalho quem divulgou: em julho o Brasil gerou 140.563 novos empregos. O número em si impressiona, mas na verdade ele é ruim. No mesmo mês de 2010 foram criadas 203.218 vagas e em junho último o número chegou a 234 mil empregos. Botando o dedo direto na ferida, esses dados mostram que o Brasil está perdendo vitalidade econômica. O setor produtivo está fraquejando e os 140 mil empregos gerados são insuficientes para fazer frente ao aumento de pessoas em idade de trabalhar. Em resumo, podemos aguardar uma alta do desemprego nas próximas semanas... apesar das garantias do Ministro Carlos Lupi (do Trabalho) de que a crise global não atingirá o Brasil.

2)  O SERASA noticiou aumento de 2,9% da inadimplência em julho diante de junho. As análises mais corriqueiras do fato tentam indicar uma acomodação do indicador já que esse é o segundo resultado “menos pior” do ano. Considerando isso uma verdade, também é forçosamente verídico que no decorrer de 2011 o clube dos brasileiros penduradores de contas vem aumentando rapidamente de tamanho. Com juros em alta, emprego em perspectiva de declínio, a situação tende a se agravar. Um dia a bolha do crédito brasileiro iria mesmo estourar. Talvez o momento esteja chegando e isso deve ser negociado logo pelas autoridades, antes que seja tarde demais.  E olha esse dado mais quente: de acordo com a Associação Comercial de São Paulo, a inadimplência  (registros de contas não honradas) da primeira semana de agosto cresceu 24,9% diante de igual período de 2010. CREDORES, TREMEI!

3)  O CNT Sensus confirmou o IBOPE com a avaliação da presidente Dilma Rousseff em 49,2%. É uma queda relevante em relação ao início do governo, mas em um patamar bastante aceitável diante do desgaste natural da fase inicial de exercício do poder (final da lua de mel), especialmente diante de tantos aprontões nos ministérios. Mas isso não quer dizer que a Patroa possa ficar tranqüila: o PR anunciou oficialmente estar deixando a base política do governo, depois de seus correligionários serem flagrados aprontando no Ministério dos Transportes; o ex-defesa Nelson Jobim não teve nada de impulsivo ao queimar as amigas de Dilma e puxar o saco do José Serra. Está claro que isso é uma jogada na busca de maior autonomia de facções do PMDB para abrir possibilidades de novos posicionamentos nas eleições de 2014. Ainda mais: aparentemente vem uma recessão por aí e isso torna conveniente a recomposição das forças políticas do país. Se a presidente não estiver preparada para enfrentar essas turbulências e reestruturar sua base de apoio, ela estará em maus lençóis. Lembremos que a nossa Chefe do Executivo tem um perfil técnico e não a malandra habilidade negociadora do antecessor.

4)  E para finalizar: o que será feito de Maureen Chao, vice-cônsul dos EUA no estado indiano de Tamu Nadu. A “diplomata” falou que sua pele estava ficando escura e suja como a dos cidadãos do país por conta da falta de banho. Provavelmente ela será convidada a voltar para casa, mas qual irá ser o motivo? Ofensa ao povo que lhe acolheu, ou por perturbar a ordem pública com acúmulo de “budum”?

Até Breve
Eduardo S. Starosta

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Imbecis Com Poder


A Grécia foi o berço da civilização ocidental. De lá foi criado o nosso modo atual de pensar (filosofia); o teatro; várias das principais formulações matemáticas que perduram até a atualidade. Os gregos disputaram com os persas o domínio do mundo conhecido por vários séculos. Um belo dia, os cidadãos da cidade-estado de Esparta decidiram que aquela coisa de sabedoria era balela; servia só para enriquecer os atenienses. O bom mesmo era impor o poder pela força. Assim, partiram para a guerra. Derrubaram Atenas, mas ficaram tão fracos que acabaram sucumbindo para a então despretensiosa Macedônia. Depois disso, os gregos nunca mais voltaram a ser grandes protagonistas da história. Apenas mantiveram o charme de civilização com antepassados heróicos e inteligentes.
Em Roma nasceram as noções de direito, clero, política e organização burocrática e militar do Estado, tal qual conhecemos e praticamos ainda nos dias atuais, além de várias evoluções da engenharia para equipamentos bélicos, estradas, transporte de água, etc. Da cidade fundada pelos lendários Rômulo e Remo amadureceu um Império de 6,5 milhões de quilômetros quadrados que derrotou quase por completo os inimigos que se opunham ao seu  expansionismo. Mas o Império criado por Júlio César acabou sendo o próprio vírus da destruição dos alicerces da Nação, realmente amadurecida na fase anterior: a republicana. Ao tirar a força das instituições representativas, uma sucessão de imperadores amalucados, como Nero e Calígula, acabaram deteriorando as bases do poder romano que, no ocidente, terminou por sucumbir diante de guerreiros não civilizados, conhecidos como bárbaros.
Mais recentemente, os malucos que ousaram invadir a Rússia (Napoleão e Hitler) viram seus países – aparentemente invencíveis no campo militar - derrotados por um inverno implacável; as ditaduras latino-americanas entre os anos 60 a 80 apodreceram rapidamente, mas ainda deixaram a herança de imaturidade política do continente; com a queda da URSS todas as ditaduras da Europa Oriental se desfizeram, promovendo até mudanças no mapa do continente, como o desmembramento da Tchecoslováquia e Iugoslávia.
 Sinteticamente, o que procuro mostrar é que civilizações aparentemente imbatíveis acabaram sucumbindo menos pela ação de inimigos externos e muito mais em função de uns poucos aloprados com ambições proféticas que conseguiram chegar ao poder maior.
Na atualidade, Líbia e Venezuela já estão pagando muito caro pelos “estadistas” que deixaram tomar conta do Estado. Mas eles são peixe pequeno e suas ações são mais encaradas como atentados humanitários localizados do que algo que realmente possa influenciar o palco político mundial.
Mas e o que dizer do recrudescimento da crise mundial (vai completar 3 anos!) nas últimas semanas? As notícias descreveram em detalhes as turbulências na Grécia por conta do risco de calote do país, atingindo secundariamente Portugal, Espanha, Itália e até a França.
Entretanto, o que pegou mesmo pesado foi o risco de o Congresso dos EUA não aumentar a capacidade de endividamento do governo (espécie de cheque especial), o que faria com que Barack Obama ficasse eternizado na história como o primeiro presidente caloteiro da Nação mais rica do mundo.
Está certo que o impasse político foi resolvido na última hora e as contas serão honradas (pelo menos por enquanto). Porém, não se pode deixar de considerar o fato de a tensão entre democratas e republicanos ter chegado a um ponto de risco do tipo “não posso pagar a quitanda na semana que vem”. E se o país mais rico fica sujeito à pindaíba, imagina então o resto do mundo? Resumidamente, o planeta inteiro usa o dólar como moeda de referência global. E a confiança das verdinhas está depositada na credibilidade dos títulos da dívida dos EUA. Se eles param de pagar suas contas, essa equação se desfaz e todos ficam com o mico na mão!
O rolo que estamos assistindo é feio mesmo. Em 2008, quando falava em palestras que a crise financeira iria durar até 2011 me chamavam de lunático apocalíptico. É verdade, eu estava delirando. A coisa se mostrou muito pior... Mas isso todo mundo já sente na pele mesmo e apesar de a nossa Dilma falar que o Brasil está preparado para enfrentar o problema (esse é o papel dela!), a coisa pode ficar periclitante para todo o lado.
Pois bem, agora chega de explicações sobre o que está acontecendo.
Como foi comentado no início deste texto, grandes civilizações aparentemente indestrutíveis acabaram se dissolvendo em função de um seleto grupo de dementes que souberam identificar os devaneios temporários da população.
No caso dos acontecimentos das últimas semanas, a bomba que explodiu no colo de Barack Obama não foi criada por ele. O atual presidente dos EUA só não teve sucesso na articulação política para desmontar a bagunça feita pelo seu sucessor.
É verdade que a crise ocorrida na virada do século em função da frustração inicial do desempenho das promissoras empresas da Internet (as. "ponto com", que eram chamadas de Nova Economia) fizeram com que a equipe de Bill Clinton desenvolvesse uma estratégia de alto risco financeiro a partir de programas de habitação. Esse problema realmente explodiu globalmente a partir de 2008. Em compensação, o ex-presidente norte-americano deixou as contas públicas de seu país em posição excelente.
Mas daí surge a campanha eleitoral. O desafio dos republicanos era derrotar um governo que tinha conseguido a marca inédita de 100 meses consecutivos de crescimento econômico e colhido os melhores dividendos do final da guerra fria (na verdade mérito do ator Ronald Reagan ao provocar nova corrida de investimentos armamentistas com o seu Guerra nas Estrelas, o que acabou quebrando a URSS).
Como derrotar alguém com esses trunfos? Ora, de duas maneiras óbvias: oferecendo dinheiro à população via devolução de impostos e roubando as eleições na Flórida, com o apoio do irmão governador. Dessa forma, George Bush Filho galgou posto de sujeito mais poderoso do planeta.
Por coincidência, cheguei nos EUA para visitar um parente no exato dia em que ele recebia o cheque de devolução do imposto de renda, de acordo com a promessa de campanha de Bush. Mais coincidência ainda foi ter embarcado na volta ao Brasil em um dos últimos aviões a deixar o espaço aéreo norte-americano no fatídico 11 de setembro de 2001.
E naquele já longínquo início de terceiro milênio foi possível assistir de camarote o degringolamento  dos fundamentos econômicos dos Estados Unidos. Os impostos devolvidos tornaram precário equilíbrio fiscal do país. Junto com isso, se somou os enormes custos de duas guerras. A primeira, contra o Afeganistão, até se justificava por conta de o país realmente abrigar a turma do Bin Laden. Mas a invasão do Iraque - mesmo que não se possa chamar Saddam Hussein de anjo - foi criminosa, a aparentemente  motivada pelo desejo de satisfazer ao papai Bush.
Em resumo, os custos da brincadeira foram tão altos que acabaram gerando uma crise fiscal nos Estados Unidos com direito a turbulentas conseqüências do resto do mundo.
E quando a agência de classificação de risco Moody's rebaixou pela primeira vez a nota dos títulos da dívida norte-americana, na prática, foi a mesma coisa do que dizer que o mundo inteiro está junto nessa encrenca.
Cabe, agora, identificar saídas e evitar que as mesmas asneiras não sejam repetidas. Isso requer um grau maior de tolerância de todos os lados. Por outro lado, a história tem a obrigação de não esquecer o nome do principal responsável por toda essa bagunça: George W. Bush.
Moral da história: delegar poder a imbecis não é boa idéia!

Até Breve!

Eduardo S. Starosta