quinta-feira, 19 de abril de 2012

A Queda dos Juros e a Encrenca Industrial Brasileira


A grande porcaria do debate político brasileiro é que ele praticamente  não existe.

Eu explico: os aliados dos governantes não admitem as menores críticas a sua gestão. Quem fala mal é tachado de cretino, ou filho de uma senhora de vida fácil. Por outro lado, quem está alinhado à oposição hostiliza qualquer projeto governamental, por mais bem que esse vem a fazer a sociedade.

Mais incrível ainda é observar que quando o poder muda de comando,  os posicionamentos  simplesmente se invertem. Por exemplo, determinado partido quando na oposição defende o aumento salarial do funcionalismo; mas ao ganhar a eleição desconversa a questão em nome da responsabilidade fiscal. Ao mesmo tempo os antigos governantes incorporam às suas bandeiras a luta que pouco tempo antes eram contrários.

Em resumo, talvez a melhor definição da política brasileira seja "A arte de ferrar o oponente".

Pessoalmente, certas vezes acho isso tudo um tanto quanto engraçado. 

Mas também não tenho dúvidas de que essa pandemia de mesquinheza e descompromisso com a verdade é um dos principais fatores que impedem o Brasil e a grande maioria de seus estados e municípios de estarem em uma situação social e econômica bem melhor do que se encontram na atualidade.

Por conta disso, faço todo o esforço para não me apaixonar por idéias. Prefiro mulheres bonitas! 

Além do mais, o vínculo emocional com pensamentos - especialmente os teóricos - acaba por criar temerosos distanciamentos da realidade e normalmente acabam em besteiras incomensuráveis.

E é assumindo essa postura despojada de paixões e bandeiras políticas que dou o meu voto de confiança inicial às iniciativas de Dilma Rousseff no sentido de tentar derrubar os juros ao consumidor e repactuar o endividamento das pessoas físicas.

A bem da verdade, esse mérito deve ser dividido com os ex-presidentes Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, que bancaram o risco político do plano real. 

Mas a história também deverá reconhecer que foi a nossa patroa que enfrentou a prova de fogo de sobrevivência à inflação: abrir mão dos juros altos como fator estrutural de proteção contra a alta dos preços. 

Em outras palavras, é muito fácil estabilizar preços às custas de juros altos, da mesma forma como é tranquilo ficar calmo usando calmante.O problema é manter o equilíbrio sem artifícios. E isso é o que está sendo tentado agora.

Vai dar certo? Não sei! 

Quem afirma com certeza que sim está mentindo e quem afirma com certeza que não também está faltando com a verdade.

A vida e a economia tem muitos fatores imponderáveis e no frigir dos ovos a postura mais coerente é simplesmente se empenhar para que tudo não desande.

Entretanto, apesar da importância do que foi feito em termos de redução dos juros, estamos tratando apenas do pontapé inicial de uma longa agenda de tarefas e ajustes para fazer com que o Brasil realmente possa usufruir estruturalmente dos juros baixos.

Além de um salutar aprendizado por parte do consumidor a respeito de seu real potencial de endividamento (para evitar nova escalada da inadimplência, a exemplo da atualidade)  uma questão importante é avaliar se a indústria brasileira está preparada para fazer frente a um aumento rápido do consumo.

Mesmo que os indicadores de produção das fábricas estejam mostrando recessão - e isso também significa capacidade ociosa - há sérias dúvidas a respeito de que a indústria brasileira tenha capacidade para suprir efetivamente o crescimento da demanda. 

Caso ocorram problemas nesse sentido, se as importações não derem conta do recado, a inflação vai voltar com toda a força e lá se vai o nosso querido Real.

E de início, há motivos para preocupação. Partindo do pressuposto de que um produto bom é aquele que vende em qualquer lugar do mundo por uma relação custo-benefício favorável, vários segmentos industriais brasileiros estão ferrados ou a caminho disso.

O indicador que mostra isso é o desempenho exportador das manufaturas de nosso país, excluindo aí o agronegócio e produtores de minérios e insumos de metais.

Os números são preocupantes:

- nos últimos seis anos, dos 27 segmentos industriais exportadores - tirando fora a base a agropecuária e mineral - 12 registraram queda das vendas externas, 6 cresceram abaixo de 30% e apenas 9 evoluíram em patamares superiores a isso;

- no intervalo de tempo em questão, as exportações da indústria de transformação aumentaram magros 12,7% ( média de 2,4% ao ano). Entretanto, se retiramos desse cálculo apenas os itens referentes aeronaves, veículos e máquinas, o resultado passa a ser uma queda de 3% ao longo dos 6 anos;

- se tomarmos como base comparativa as exportações do ano passado em relação às vendas internacionais de 2008 (logo antes da crise mundial) verifica-se que apenas 8 segmentos conseguiram recuperar suas vendas aos patamares de 3 anos atrás;

- ainda mais: comparando o desempenho de 2011 frente ao ano imediatamente anterior, 14 segmentos industriais mostram queda exportadora, contra 13 em expansão.

Realmente, para um país que se propõe a ser uma potência industrial   no contexto do BRICS (especialmente Índia e China), esse desempenho de comércio exterior é bem insatisfatório.

Mas antes de culpar os empresários, deve-se ter em conta que grande parte da perda de competitividade foi devido à sobrevalorização do Real frente as outras moedas internacionais, além de um sistema de promoção comercial centralizado pelo governo que se mostrou claramente ineficaz, ao tentar considerar tudo que é produto e mercado como "farinha do mesmo saco".

 Sem querer malhar culpados, a questão fundamental desse quadro é a dúvida a respeito de a indústria brasileira - por conta das dificuldades exportadoras (e evidentemente dificuldades de agir no mercado interno pela vantagem competitiva dos importados mais baratos) - ter ficado ou não sucateada para fazer frente ao aumento do consumo interno que tende a se concretizar com a queda dos juros.

Se a resposta for positiva, o aumento das vendas do comércio não deixará de acontecer. Porém, o Brasil estará perdendo a oportunidade  de aproveitar da melhor forma a expansão do consumo interno para gerar riqueza.

Trocando em miúdos, depois de reduzir o custo do crédito, a principal urgência passa a ser a implementação de políticas voltadas à modernização e competitividade industrial brasileira. 

A recuperação cambial é só o começo. Redução de impostos, melhoria das linhas de crédito e subsídio à pesquisa e desenvolvimento de produtos são itens essenciais nessa caminhada.

Estados Unidos e Europa se ressentem duramente em ter terceirizado sua produção industrial para os chineses e indianos. 

Será que o Brasil, um país ainda pobre, pode ser dar ao luxo de arriscar a perder a capacidade de produzir boa parte dos produtos que consome, mesmo com tanta fartura de matéria prima.

Acredito que não. Mas essa não é uma opinião unanime.

Até Breve


Eduardo Starosta

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