quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Tentando Entender a Crise Global – Parte 3: O Comércio Internacional e a Fábula do Galo

A fábula  é bem antiga. No tempo em que os animais falavam entre si, todos tinham especial respeito pelo galo. Afinal de contas, era logo depois de seu canto da madrugada que o sol nascia. O problema é que com tanto prestígio, o galináceo ficou demasiadamente gabola e chato.

Por conta desse comportamento, a bicharada resolveu dar uma gelada no Pavarotti das aves. Este, por sua vez, ameaçando parar de cantar - o que impediria o nascimento do sol - conseguiu, durante muito tempo, manter a hegemonia do reino animal. Mas o bicho estava tão insuportável que todo o resto da  fauna concordou em ficar um tempo sem sol em troca de ter o prazer de dar uns cascudos no traseiro do galo pentelho. Por sua vez, em represália, o convencido cantor fez greve na madrugada seguinte.

E o sol acabou nascendo como em todos os dias, trazendo um bônus especial: os animais acordaram com os ouvidos em harmonia, sem a voz irritante do galináceo. Mas o melhor de tudo, segundo os testemunhos da época, foi a sensação de liberdade e a oportunidade de ridicularizar a ave.

É dessa fábula que se originou a expressão "cantar de galo", ou seja, contar vantagens sobre méritos que não realmente não possui.
Agora, saindo da Carochinha e voltando ao nosso mundo, é instigante lembrar que a crise global iniciada em setembro de 2008 veio acompanhada de profecias de arrepiar os cabelos.
·         O sistema financeiro iria desmoronar;

·         Os países ricos iriam entrar em colapso, com o Dólar, Euro, Iene e outras moedas fortes tendo o risco de morte súbita;

·         A economia global entraria em forte depressão por conta da redução drástica do comércio exterior.
Não tenho a intenção de discutir aqui se os bancos, as moedas e as importações/exportações mundiais realmente passaram por fortes impactos negativos a partir do início da crise financeira. É evidente que sim! Porém, ao contrário do que sempre a mídia destacou, o baque decorrente da crise nas três citadas frentes – mesmo que perceptível – não foi nenhum fim do mundo.
        Vamos ver alguns números específicos do comércio exterior.
·         Em 2001, o total das importações era equivalente 19,29% do PIB mundial (toda a riqueza produzida no mundo);

·         Daquele ano até 2008, o PIB do planeta - segundo o Banco Mundial - cresceu 23,8%, enquanto as importações aumentaram 113,49%. Por conta disso, era comum ouvir falar que o comércio exterior (ou processo de globalização, como os moderninhos gostam de chamar) seria o grande responsável pelo desenvolvimento do mundo. No ambiente dos “negócios” falar em proteger mercados era como cometer um pecado mortal (lógico que isso não se aplicava à agricultura dos países desenvolvidos...).

·         Mas daí, em 2009, por conta da falta de dinheiro fácil, as pessoas e os países pisaram no freio das compras internacionais. Somente naquele ano, as importações globais despencaram 22,9%. O fim do mundo dos maias estava prestes a acontecer antes de 2012! E veja só: depois de tanta tempestade, o planeta viu sua riqueza reduzida em 2,05%.

Se imaginarmos que a economia global é um  boi de 600 kg, o emagrecimento seria de 12,3 kg, o que é equivalente a um peru (a ave!) de 4 meses de vida. Por sinal, o prato preferido de dez entre dez Natais é aparentado do galo. E assim, retornamos a nossa fábula: Teve gente que cantou de galo, já que o impacto do comércio exterior e até do setor financeiro sobre a vida da maioria das pessoas não foi tão grande assim. Sofreu mais somente quem vive de exportação e de jogo financeiro, o que não é tanta gente assim, apesar do poder de fazer barulho que tem essa turma.

Não que a questão deixe de ser importante. Mas fica claro que a grande força da economia está no mercado interno da maioria dos países (claro, há exceções como Bélgica, Hong Kong, Japão, Rússia – por causa do petróleo - etc.). Um outro dado que comprova isso é que em 2010 o PIB mundial já estava recuperado do tombo do ano anterior, crescendo 2% diante de 2008, enquanto as importações ainda amargavam uma queda de 9,4% nessa mesma comparação.

E qual a explicação para isso? Na maioria dos casos, não é difícil. Simplesmente as pessoas deixaram de comprar tanto coisas de fora de seu país (como carros, ipods, azeitonas recheadas com atum em conserva no vinagre balsâmico, etc.) e as substituíram por produtos mais comuns no dia a dia.

Particularmente, o Brasil foi uma exceção a essa regra por conta do Real supervalorizado. Daí, apesar de podermos usufruir por mais tempo das delícias globais, essa festa tem um preço bem salgado: tal situação está intimamente ligada aos juros altos e às dificuldades enfrentadas pela indústria nacional, que será a abre-alas da recessão que se aproxima.

É esperar para ver!

Até Breve.

Eduardo S. Starosta

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