quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Como Gastar o Dinheiro dos Impostos



Dia desses saiu o total dos impostos arrecadados em 2011 pelo governo federal. 

O valor chegou a R$ 993,6 bilhões, o que é dinheiro para dedéu. Realmente, é tanta grana que não se tem como dimensionar o que fazer no campo dos sonhos, do tipo... se eu ganhasse na loteria. O melhor, então, é dizer que dá para fazer praticamente qualquer coisa no âmbito individual; que o maior delírio  em gastança não faria cócegas em tamanha fortuna.

Mas vamos parar de pensar besteiras, já que estamos falando em dinheiro dos impostos e usar recursos públicos unicamente em benefício próprio dá cadeia (pelo menos é o que diz a Lei!).

Mas não tem nada de errado em imaginar que o dinheiro dos tributos, antes de ser do governo, pertence ao conjunto da população brasileira, se é verdade que o povo é quem manda. 

Nessa ótica, está pelo menos parcialmente correto dizer que cada um dos cerca de 193 milhões de brasileiros tem direito, em media, a R$ 5.142,54 (valor per-capita dos impostos arrecadados em 2011).

Daí já dá para ter uma idéia do que fazer com o dinheiro caso ele fosse – na imaginação – redistribuído, em espécie,  igualitariamente entre os brasileiros.

Poderíamos, por exemplo, todos decidirmos comprar ao mesmo tempo a clássica motocicleta CG 125, da Honda (na verdade, custa  R$ 5.280, mas certamente a Honda dá um descontinho para grandes quantidades...) e deixar motorizada a população inteirinha. Imagina o trabalho dos Detrans para emitir tantas cartas de motorista...

Sim, seria uma confusão danada, pois nessa conta até os bebês estariam motorizados.

Dividindo o dinheiro dos impostos federais arrecadados em 2011 é  possível comprar uma moto dessas para cada brasileiro. Imagina só como ficaria o trânsito?
Então, vamos tentar outra coisa. Com o dinheiro arrecadado dos impostos do ano passado, seria possível mandar todos os brasileiros para passarem duas semanas de férias em Miami, podendo de quebra ir na Disney e trazer todos os badulaques desejados dentro da quota de US$ 500 de compra no exterior.

Mais uma vez no campo da imaginação, ia ser interessante: deixar o Brasil descansando completamente da própria população por 14 dias e invadir a terra do Tio Sam e Barack Obama, achando tudo por lá “pitoresco”.

Com o dinheiro arrecadado em impostos federais em 2011, toda a população poderia ir aos EUA, com direito a visitar a Disney. Será que com um apelo turístico desses, o Barack Obama iria tocar pandeiro?
Mas se resolvêssemos usufruir individualmente o dinheiro dos impostos federais no dia-a-dia, cada um teria uma renda de cerca de R$ 14,00, o que seria mais do que o suficiente para todos comerem uma bela ala-minuta diária, daquelas que não se consegue liquidar sozinhos, do tipo oferecido pelo restaurante Tudo Pelo Social em Porto Alegre (RS).

As suposições acima são meramente ilustrativas para tentar tornar um pouco mais palpável o significado da fantástica arrecadação do governo federal. E essa renda vem se expandindo dos últimos anos de forma muito superior a formação nacional de riqueza. 

Por exemplo, o PIB de 2011 dificilmente deverá fechar com crescimento superior a 2,9%. Entretanto, o governo majorou sua receita em cerca de 10,1% em termos reais, significando isso puro aumento de carga tributária que, em outras palavras, é dinheiro saindo da carteira do contribuinte e indo para o bolso do governo.

Essa é uma questão antiga que as entidades de classe de trabalhadores e empresariais deveriam levar mais a sério. O problema é que afora algumas exceções, a maioria dos “líderes” do setor privado prefere colecionar tapinhas nas costas dos governantes do que realmente levarem adiante os interesses da própria base associativa.

E mesmo com arrecadação gigantesca e crescente, a dívida interna do Estado não pára de crescer, superando a bagatela de R$ 1,86 trilhão.

Sabe-se que o governo, por conta da sua estrutura histórica, tem sérios problemas de gestão tanto da receita como da despesa pública, o que acaba dando a impressão de que nossas gordas contribuições ao fisco de nada servem. 

Simplesmente, a percepção da maioria das pessoas é que as coisas demoram demais para mudar para melhor, isso quando mudam.

Provavelmente, o exemplo mais gritante da frustração no uso das verbas públicas esteja no setor de saúde. Quase todos os dias a mídia destaca algum hospital em colapso de atendimento, com pessoas morrendo sem serem socorridas, ou até flagelos maiores.

Tal questão é facilmente compreensível com uma rápida análise de dados. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) a infra-estrutura de atendimento hospitalar minimamente razoável deve prever 4,5 leitos para cada 1000 habitantes. No Brasil, isso significa a necessidade de 869.464 leitos, existindo apenas 464.700 (CNES 2012).

O déficit hospitalar, então, é de 404.754 leitos. 

Diante desse número, ficam perfeitamente explicadas as cenas lamentáveis  que assistimos a contra-gosto, de pacientes estocados nos corredores dos hospitais, ou nem conseguindo entrar nos estabelecimentos de saúde.

Mas será que para consertar o problema será necessário um plano de longo prazo que só beneficiará a próxima geração, na melhor das hipóteses? 

Bem, tudo depende da vontade política, já que construir hospitais apenas depende de recursos para materializar as obras civis e adquirir os leitos e equipamentos necessários.

Mas 404.754 leitos devem custar um dinheirão, especialmente se gasto de uma só vez. 

É verdade, o investimento médio de cada leito (incluindo toda a infra-estrutura de tratamento de um hospital preparado para 200 leitos) é de  R$ 225.250, segundo interessante trabalho realizado por Ernesto Lima-Gonçalves e Carlos Augusto Aché. No total, os 2024 hospitais que faltam no Brasil custariam, inferindo-se do citado estudo, R$ 91,17 bilhões.

Sim, sem dúvida é muito dinheiro. Entretanto, tal montante corresponde a apenas 9,18% da receita tributária do governo federal. E quem vai dizer que um grande mutirão de construção de hospitais durante um ano não seria uma idéia no mínimo interessante? 

Se um projeto desse tipo for diluído em dois ou três anos, a supressão do déficit hospitalar brasileiro fica até mais fácil. Porém, a diminuição de ímpeto sempre é temerária, pelo alto risco de desvio de foco dos objetivos realmente importantes.

Junto com a saúde, grande parte das reclamações dos brasileiros são dedicadas à falta de segurança pública. Cada vez mais os cidadãos são obrigados a viver enjaulados na própria casa para deixarem os bandidos livres pela rua. O argumento da justiça e do próprio poder executivo sempre descamba para a questão da falta de vagas em presídios, eventualmente passando por questões processuais.

Exatamente, qual é o déficit de prisões e quanto isso custa?

Vamos lá: o Brasil tem cerca de 470 mil detentos e cerca de 300 mil “acomodações” para a turma do crime, havendo um déficit direto de 170 mil vagas que fazem com que os pobrezinhos dos bandidos fiquem eventualmente empilhados.

Mas já que boa parte dos que deveriam estar atrás das grades andam pelas ruas matando e assaltando por não terem  “hospedagem”, tomo a liberdade de aumentar o número do déficit para 500 mil de forma a garantir o devido direito à aposentadoria em cela própria a quem vai para o crime.

Tomando como exemplo a Penitenciária Federal de Porto Velho, que custou R$ 25 milhões para abrigar 208 presos, temos um custo de R$ 120.192 para cada preso de alta periculosidade. Pegando esse padrão, para ter jaulas individuais disponíveis de 7 m2, com direito a cama, banheiro e outras coisas mais, para meio milhão de delinquentes, o custo ficaria em R$ 60,096 bilhões, o que corresponde a 6,05% da avantajada arrecadação dos impostos federais em 2011. Evidentemente, o valor das obras pode cair sensivelmente nesse caso. 

Mas se for para nos livrar da violência nas ruas, que se pague imediatamente os R$ 60 bi!

Falei aqui de exemplos dos mais simples do uso do dinheiro do governo para resolver problemas pontuais do país no menor prazo possível, na forma de mutirão. Elejam 2012 o ano dos hospitais; 2013 o das cadeias e assim por diante e mãos à obra.

Veja que não abordei temas como educação, irrigação e outros de maior complexidade, que contém aspectos subjetivos e não apenas custos diretos.

Vale a mensagem de que se o governo brasileiro conseguir desvincular dos trâmites burocráticos pelo menos 10% da receita pública e investir esses recursos de maneira focada, em pouco tempo, boa parte dos piores problemas nacionais seriam resolvidos.

Sim, haverá os que responderão a tal provocação com um evasivo “não é bem assim”.
A eles eu replico: se não é bem assim, como é exatamente? 

Duvido que tenham a resposta!

Até Breve

Eduardo Starosta




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